Crise mundial na produção de cacau abre novas possibilidades ao Brasil
Com manejo correto e o uso de tecnologias como a irrigação localizada, Estado do Ceará acelera a retomada da cultura no País e ganha protagonismo podendo alavancar produtores brasileiros no cenário internacional

A Páscoa de 2025 foi uma das mais caras (e amargas) dos últimos anos após a disparada de preços da principal matéria prima do chocolate no mercado internacional. De acordo com a Organização Internacional do Cacau (ICCO), em comparação com o início da temporada 2024/25, os valores aumentaram 66% em Londres, passando de US$ 6,896 por tonelada em 1° de outubro de 2024 para US$ 11,441/ton, em 31 de dezembro de 2024. Em Nova York, a elevação foi de 64% no mesmo período, de US$ 7,061/ton para US$ 11,545/ton.
Entre os principais fatores dessa alta, está a redução da oferta global nos campos de produção. Costa do Marfim e Gana, os dois maiores fornecedores mundiais de cacau, enfrentam problemas que contribuem para esse cenário. Eventos climáticos extremos, o aumento das infestações dos vírus CSSV (Cacao Swollen Shoot Virus), também conhecido como broto inchado e lavouras em idade avançada com baixa produtividade, são alguns dos principais motivos que combinados resultaram na situação atual.
Como este cenário não deve ter rápida resolução no curto-médio prazo, em meio a essa crise de oferta de cacau, surge uma nova oportunidade ao Brasil. A chance de retomar o protagonismo utilizando tecnologias como a irrigação localizada em uma cultura que, entre as décadas de 1930 e 1980, foi símbolo de riqueza, mas que, à época, foi afetada uma das maiores tragédias fitossanitárias da agricultura brasileira.
A Vassoura-de-bruxa mudou profundamente a história do fruto no Brasil, especialmente na Bahia, que até então era uma das maiores regiões produtoras do mundo. A doença chegou oficialmente em 1989. O patógeno, um fungo chamado Moniliophthora perniciosa, provavelmente já estava na região amazônica, mas foi introduzido na Bahia de forma suspeita e criminosa, segundo investigações da época.
O surto se agravou rapidamente e o País perdeu cerca de 70% da produção de cacau na Bahia em menos de 10 anos. Ou seja, passou da produção de quase 400 mil ton/ano para 123 mil ton/ano nos anos 2000. Desta forma, houve a quebra de milhares de agricultores e falências generalizadas. “A Vassoura-de-bruxa praticamente acabou com a produção cacaueira no Brasil, principalmente na Bahia e na Amazônia e gerou um colapso social e ambiental que até hoje gera reflexos”, disse, Adolfo Moura, engenheiro agrônomo que há mais de 10 anos se dedica às pesquisas, desenvolvendo clones produtivos e adaptados ao nordeste da cultura.
Agora, 35 anos depois, o Brasil tem a oportunidade de reescrever essa história deixando de ser coadjuvante para se tornar protagonista mundial na produção e a tecnologia é a mola propulsora desse novo momento. “Com essa quebra de produção no mundo, o Brasil tem a chance de suprir essa demanda, porém o cultivo nacional ainda é muito tímido e precisamos ampliar as áreas plantadas para primeiro atender a demanda interna, que é alta, e posteriormente pensar em exportação”, reforçou Moura.
Irrigação como protagonista
A adoção de tecnologias de irrigação, especialmente o gotejamento, terá um papel importante no futuro para o cultivo do cacau no Brasil. Essa técnica permite a aplicação precisa de água e nutrientes diretamente na zona radicular, reduzindo perdas por evaporação (com eficiência superior a 90%) e aumentando a produtividade em até 150% em comparação a sistemas não irrigados, de acordo com dados de projetos da FAO e do World Cocoa Foundation.
Com o apoio da solução, como a da Rivulis, e o cultivo a pleno sol, anteriormente inviável em muitas regiões, tornou-se uma realidade. Mudas jovens podem ser irrigadas com volumes entre 2 a 5 litros por planta por dia, enquanto árvores adultas exigem 20 a 40 litros por dia, dependendo do estágio fenológico e das condições climáticas. A fertirrigação por exemplo, permite ainda o fornecimento regular de micronutrientes como zinco, ferro, boro e magnésio, otimizando a absorção e o desempenho das plantas.
Em áreas irrigadas e com manejo intensivo, é possível atingir produtividades acima de 2.000 kg/ha/ano, reduzindo os ciclos improdutivos e aumentando a uniformidade das safras. Isso representa quase quatro vezes mais do que a média observada em muitos países africanos, aumentando a renda do produtor e tornando a atividade economicamente viável em áreas antes marginalizadas.
Cacau cearense já é realidade
Uma das regiões que abriu as portas para o Cacau foi o Ceará. A principal iniciativa o estado teve início em 2010 por meio de um projeto de cooperação mútua a partir da união entre a Associação Univale, com apoio do produtor João Teixeira Junior, da Frutacor, CEPLAC (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira), órgão do Ministério da Agricultura e a Embrapa.
O projeto foi liderado pelo engenheiro agrônomo e especialista em cultura irrigada, Diógenes Henrique Abrantes Sarmento, com o objetivo de implantar culturas alternativas em plena seca, na região do Vale do Jaguaribe/CE. “Fui contratado para coordenar essas pesquisas e testamos em várias regiões do Estado, o plantio de cacau, caqui, maçã e pera. Após anos de estudos, a cultura que melhor se adaptou foi o cacau”, disse Sarmento.
Animados com o bom desempenho e adaptação do cacaueiro na região, a primeira área de quatro hectares foi consolidada. Nessa implantação, em 2010, foram utilizados 12 clones, os mais adaptados ao Brasil. Destes, as variedades CCN51 e o PS319 se destacaram com produção média variando de 2,5 ton a 3 ton por hectare, um resultado muito superior às áreas tradicionais que atingiam no máximo 900 kg/ha. “Esse resultado comprovou o potencial da cultura no Estado. Juntamente à qualidade do clone, fizemos um bom manejo de solo e tivemos muita atenção desde o pré-plantio ao pós-colheita. Somado a tudo isso com auxílio da irrigação localizada, tornou-se possível a alta produção alta em pleno calor e sol cearense”, disse Sarmento.
Importância da irrigação
Com este novo momento do cacau no Brasil migrando para uma área mais quente e mais seca, comprovadamente a irrigação torna-se fundamental com melhores perspectivas e opção por gotejamento, se tornou o principal alicerce do modelo produtivo. Essa técnica permite controle preciso da água e dos nutrientes, promovendo plantas mais saudáveis, lavouras mais uniformes e uso racional dos recursos naturais.
Segundo Carlos Barh, engenheiro agrônomo com mais de 50 anos de experiência em irrigação, hoje na Rivulis é responsável pela área de suporte técnico ao cliente de pré e pós-vendas, por conta da precisão e eficiência, a irrigação por gotejamento é a que se mostra mais apropriada para o cultivo. “O cacau nasceu para ser irrigado por gotejamento, pois a técnica não deixa aumentar umidade, que pode acarretar o desenvolvimento de fungos. A planta fica mais sadia, pois tecnologias como as da Rivullis possibilitam que recebam o recurso no momento que precisam e na quantidade certa”, diz.
Ainda segundo o especialista da Rivullis, líder global em soluções de microirrigação, também é fundamental reforçar a importância da fertirrigação no gotejamento. “A planta sem água não vive e só com água também não se desenvolve. Por isso, é fundamental colocar os nutrientes certos no momento que as plantas necessitam. É uma forma extremamente eficiente, pois as perdas de nutrientes são mínimas e a planta vai responder com produtividade e qualidade”, acrescentou Barh.
Desafio logístico
Após identificar os clones mais eficientes, a melhor forma de irrigar e ajustar o manejo da cultura e de solo, o desafio seguinte do cacau cearense foi a logística. Ou seja, como escoar a produção das principais indústrias que ficavam na Bahia, algo que era muito complexo e oneroso.
Com a boa qualidade dos frutos, Sarmento e sua equipe decidiram verticalizar a produção. “Percebemos que a nossa amêndoa era fina e de boa qualidade, excelente para produção de chocolate e manteiga de cacau. Assim, em 2018 fundamos, em Limoeiro do Norte, a empresa Cacau do Ceará, a primeira indústria a usar a matéria prima exclusiva de produtores do Estado”, lembrou o engenheiro agrônomo.
Com a indústria local, aquela área inicial de quatro hectares foi sendo ampliada. Os estudos mostraram que também seria possível consorciar outras culturas na mesma área do cacau gerando novas fontes de renda. Desta forma agregou o cultivo de coco e banana.
A partir de então o projeto decolou, atualmente já somaram mais 300 hectares de produtores cearenses que se interessaram e também resolveram apostar no cultivo. “Passamos a ter o plantio em larga escala e buscamos cada vez mais agregar valor para que os produtos saiam prontos e embalados para o mercado consumidor tanto do Ceará quanto do Brasil, não só do chocolate em si, mas de outros subprodutos do cacau”, destacou Sarmento.
Com operação desde maio de 2021, a planta industrial já está sendo expandida e a capacidade de produção deve passar de 100 quilos para até uma tonelada por mês. “O Cacau hoje é realidade aqui no Ceará, há muita procura por parte de produtores e indústria e a nossa meta é até janeiro passar dos 400/ha plantados aqui na região”, acrescentou o engenheiro agrônomo.
Potencial e oportunidades futuras
Com a qualidade dos clones utilizados atualmente, o cacau tem potencial para ser expandido para todo o estado do Ceará e outras regiões do Nordeste, Centro-Oeste até o Sudeste. Segundo Sarmento, o cultivo do fruto é uma atividade que requer pouca mão de obra, algo bem escasso no Brasil, e é uma cultura que pode ser plantada em épocas quentes e pode ser facilmente consorciada com outras culturas, ideal para todas as categorias de produtores.
Ainda segundo ele, outra vantagem é o alto retorno financeiro com boa rentabilidade. “Com bom manejo mesmo sendo áreas pequenas facilmente o produtor consegue atingir cerca de três mil kg de amêndoa/ha pegando o média atual hoje de R$ 50 gera uma renda bruta de R$ 150 mil com o custeio de cerca de R$ 22 mil, o que deixa grande margem a ele”, destacou.
Agora para ampliar a produção, o setor cacaueiro busca incentivos por meio de parcerias público e privadas para que possam avançar em pesquisas para alavancar a produção em diversas regiões do Brasil. Para isso, dados de produção e produtividade do mercado e financiamentos e linhas de créditos específicas dos bancos tornam-se indispensáveis. “É preciso também cursos de capacitação para melhorar a mão de obra e o manejo da cultura formando consultores locais bem como o avanço de novos viveiristas (produtores de mudas) diminuindo a fila de espera por novas mudas”, finalizou Sarmento.
Fonte: Kassiana Bonissoni - Gerente de atendimento
kassiana.ruralpress@gmail.com
Via: Agência Logística de Notícias
contato@agencialogistica.com.br
(91) 3212 1015 - (91) 98112 0021
Comentários (0)
Comentários do Facebook